Quando
Eu For Pequeno
Quando
eu for pequeno, mãe,
quero
ouvir de novo a tua voz
na
campânula de som dos meus dias
inquietos,
apressados, fustigados pelo medo.
Subirás
comigo as ruas íngremes
com
a certeza dócil de que só o empedrado
e
o cansaço da subida
me
entregarão ao sossego do sono.
Quando
eu for pequeno, mãe,
os
teus olhos voltarão a ver
nem
que seja o fio do destino
desenhado
por uma estrela cadente
no
cetim azul das tardes
sobre
a baía dos veleiros imaginados.
Quando
eu for pequeno, mãe,
nenhum
de nós falará da morte,
a
não ser para confirmarmos
que
ela só vem quando a chamamos
e
que os animais fazem um círculo
para
sabermos de antemão que vai chegar.
Quando
eu for pequeno, mãe,
trarei
as papoilas e os búzios
para
a tua mesa de tricotar encontros,
e
então ficaremos debaixo de um alpendre
a
ouvir uma banda a tocar
enquanto
o pai ao longe nos acena,
lenço
branco na mão com as iniciais bordadas,
anunciando
que vai voltar porque eu sou
[pequeno
e
a orfandade até nos olhos deixa marcas.
José Jorge Letria, in "O Livro Branco da
Melancolia"
Pequeno
Poema
Quando
eu nasci,
ficou
tudo como estava.
Nem
homens cortaram veias,
nem
o Sol escureceu,
nem
houve estrelas a mais...
Somente,
esquecida
das dores,
a
minha Mãe sorriu e agradeceu.
Quando
eu nasci,
não
houve nada de novo
senão
eu.
As
nuvens não se espantaram,
não
enlouqueceu ninguém...
Pra
que o dia fosse enorme,
bastava
toda
a ternura que olhava
nos
olhos de minha Mãe...
Sebastião da Gama, in “Antologia Poética”
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