quinta-feira, 29 de janeiro de 2015



"O definitivo sinal da liberdade é o facto de o medo deixar espaço ao gozo tranquilo da independência".

Stig Dagerman (1923-54), escritor sueco.




A gaivota já poisou em todos os meus versos
trazendo sempre uma promessa de distâncias irreais.

Chega com o mau tempo. Fica de vigia.
Apenas uma brisa leve lhe arrepia
o desenho solene e rigoroso que compõe à beira do cais.
Há mundos insondáveis no riso que me lança
e que acende no meu peito uma criança com desejo
de improváveis desarrumos tropicais.

Quando abrir de novo as asas e partir
em busca de outros continentes, outras ilhas
deixará na praia do poema alguma pena
e o mapa confuso de pegadas andarilhas.

Digo adeus e fico a vê-la
a afastar-se lentamente no azul
e repito para mim próprio
e juro e volto a jurar
que um dia abro a janela
e vou com ela
viajar


José Fanha, Poemas com animais



segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

AS AMIGAS- ilustração de Gabrielle- 6ºB

Amigo

Mal nos conhecemos
Inaugurámos a palavra «amigo».

«Amigo» é um sorriso
De boca em boca,
Um olhar bem limpo,
Uma casa, mesmo modesta, que se oferece,
Um coração pronto a pulsar
Na nossa mão!

«Amigo» (recordam-se, vocês aí,
Escrupulosos detritos?)
«Amigo» é o contrário de inimigo!

«Amigo» é o erro corrigido,
Não o erro perseguido, explorado,
É a verdade partilhada, praticada.

«Amigo» é a solidão derrotada!


 «Amigo» é uma grande tarefa,
Um trabalho sem fim,
Um espaço útil, um tempo fértil,
«Amigo» vai ser, é já uma grande festa! 


 Alexandre O'Neill, in 'No Reino da Dinamarca'

sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

O PRÍNCIPE NABO, de Ilse Losa

Os alunos do 5ºD e 5ºF ilustraram a história do Príncipe Nabo, de Ilse Losa,  cuja obra foi lida e analisada nas aulas de Português. Ainda assistiram, assim como as restantes turmas do 5º ano, à peça de teatro homónima. As ilustrações estão fantásticas!























quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Até na roupa que seca ao sol tímido de janeiro há poesia…



NAS VARANDAS DA MINHA RUA

Há roupas estendidas em todas as varandas da minha rua. Chegou o sol a meio de janeiro, claridade que atravessa o frio. As roupas estendidas a secar são bandeiras privadas, cada uma representa o país específico e concreto de um corpo.
Noutras horas, estas roupas cobrem a pele de gente com pensamentos. São calças a caminhar com pressa para chegar a algum lado, onde precisam de sentar a sua fazenda. São camisas que envolvem peitos a respirar, corações que batem e que, lá nessa intimidade rente à pele, fazem soar pancadas graves e certas, lentas. São cuecas que dão conforto à minha vizinha da frente, uma senhora com mais de setenta anos, que aprecia bons elásticos, capazes de lhe darem uma segurança física que, sem esforço, transporta para outras dimensões do seu quotidiano.
Os lençóis, brancos ou de cores claras, são velas de naus que ainda navegam. A brisa, mesmo esta brisa gelada de janeiro, alimenta-os de uma liberdade que, depois, noutras horas, são capazes de transformar em aconchego maternal. À noite, quando esta rua amansa até quase desaparecer, são estes lençóis que envolvem os corpos adormecidos de todos os que habitam estas casas, que saem delas e que regressam a elas. Durante esse tempo de consciência dissolvida no sono, os seus corpos perdem forças e precisam de um espaço que os agarre e regenere. Esse espaço são estes lençóis, agora estendidos a secar, a aproveitarem esta luz em janeiro.
E tudo aquilo que se agarra à pele, ou tudo aquilo que a pele segrega, que a atravessa de dentro para fora, chega a esta roupa e permanece na sua superfície. A transpiração, fruto do esforço e do tempo, ou o cheiro, fruto da identidade mais profunda e biológica, colam-se a estes tecidos. A transpiração é embebida por estes tecidos. Os contornos das pessoas da minha rua ficam marcados nos lençóis onde dormem. Depois, num momento, como na canção de um filme antigo, água e sabão diluem essas marcas. Esses restos de pele seguem com a água e, se resistem, evaporam em dias como este, nas varandas da minha rua, ascendem ao céu da cidade, misturam-se com o ar que, amanhã, quando já não dermos por isso, será respirado, bebido, regressando ao corpo.
Assim, há um ciclo que se renova nesta roupa estendida. Não é apenas uma imagem desta rua e das ruas que, agora, nesta cidade, aproveitam o dia; é algo muito mais profundo, feito de tato: é a memória de dedos, suaves, que nos educaram na sensibilidade de estarmos despertos para aquilo que nos chega à pele.
Agora, as pessoas da minha rua estão espalhadas pela cidade. Não sou capaz de descrever todas as intenções que carregam, talvez seja impossível fazê-lo, não sou capaz de descrever os seus corpos à procura de caminhos; mas sei que, no futuro próximo, talvez já amanhã, talvez na próxima semana, terão estas roupas a envolvê-los. Nelas, irá um pouco do sol deste dia, janeiro luminoso, e, mesmo que ninguém se lembre de reparar, estará lá um pouco deste brilho, misturado com vida, a dar vida, a repetir vida.

por José Luís Peixoto



ALÉM DA TERRA, ALÉM DO CÉU

Além da Terra, além do Céu,
no trampolim do sem-fim das estrelas,
no rastro dos astros,
na magnólia das nebulosas.
Além, muito além do sistema solar,
até onde alcançam o pensamento e o coração,
vamos!
vamos conjugar
o verbo fundamental essencial,
o verbo transcendente, acima das gramáticas
e do medo e da moeda e da política,
o verbo sempreamar,
o verbo pluriamar,
razão de ser e de viver.


Carlos Drummond de Andrade

quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

ESPREITANDO 2015 COM NOVAS LEITURAS…


E a propósito de leituras, não se esqueçam de participar no Concurso Nacional de Leitura, na nossa escola, no dia 14 de janeiro. Têm mais uns dias para além da data inicialmente agendada. Vamos lá…Esperamos por vocês. Não faltem!

quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

O revisor ... o pica ... o sete ... o Zambujo ... Uma delícia!






SONHO

Teria passado a vida
atormentado e sozinho
se os sonhos me não viessem
mostrar qual é o caminho

umas vezes são de noite
outras em pleno de sol
com relâmpagos saltados
ou vagar de caracol

quem os manda não sei eu
se o nada que é tudo à vida
ou se eu os finjo a mim mesmo
para ser sem que decida.

Agostinho da Silva, in 'Poemas'

terça-feira, 6 de janeiro de 2015


O Dia de Reis, que hoje se assinala, está associado ao bolo-rei e ao "cantar das janeiras" e põe fim às festividades de Natal e Ano Novo, tendo origem na Bíblia, o livro sagrado da Igreja Católica.
"Tendo Jesus nascido em Belém da Judeia no tempo do rei Herodes, vieram do oriente uns magos a Jerusalém, perguntando: Onde está aquele que nasceu Rei dos Judeus? Porque vimos a sua estrela no oriente, e viemos adorá-lo", lê-se no evangelho de S. Mateus (capítulo II).

O dia que hoje se assinala terá origem aqui, sendo o 06 de janeiro mais importante do que o Natal para os cristãos ortodoxos. Assinala a visita de "reis magos" a Jesus, oferecendo-lhe presentes (em Espanha mantém-se a tradição de trocar presentes neste dia), e assinala ainda o fim das janeiras (cantares que na tradição eram religiosos).