A
CENSURA EXISTE EM TODO O LADO
Eu
acho que a censura existiu sempre e provavelmente vai existir sempre. Porque a
censura para o ser não necessita de ter claramente uma porta aberta com um
letreiro, onde se diga que ali há pessoas que leem livros ou vão ver espetáculos.
Não! A censura existe de todas as maneiras, porque todas as pessoas, nos
diferentes níveis de intervenção em que se encontram, por boas ou más razões,
selecionam, escolhem, apagam, fazem sobressair. E isso são atos de ocultação ou
de evidenciação que, no fundo, em alguns casos, são atos formais de censura.
(Quanto
à censura oficial dos tempos de ditadura) Aquilo que a censura demonstrou e
demonstra, em qualquer caso, é que felizmente os escritores, dependendo das
situações em que se encontram, são muito mais ricos de meios, de processos de
fazer chegar aquilo que querem dizer aos outros, do que se imagina.
Evidentemente, numa situação de censura, o escritor é obrigado a usar a escrita
para comunicar isto ou aquilo ou aqueloutro, de uma maneira disfarçada,
subterrânea, oculta; mas o que é importante não é que a censura o esteja a
obrigar a fazer isso. O que é importante é que ele seja capaz de o fazer. E
isso não vai em abono da censura como agente capaz de estimular a criatividade
de um escritor, vai, sim, no sentido de reconhecer no escritor capacidades de
expressão que ele usará ou não consoante a situação concreta em que se
encontre. Agora, se me pergunta: a escrita sai melhor de uma maneira ou sai de
outra, eu diria que provavelmente alguns dos livros que escrevi numa situação
de liberdade de expressão, provavelmente num regime de censura eu não pensaria em escrevê-los.
José Saramago, in "Diálogos
com José Saramago"
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