Cheiro a Café
João Afonso
Uma noite escrevi o teu nome
num café
a cafeteira adormece breve
mesmo ao pé
O mar que passa
pela vidraça
senta-se à mesa
cheira a café
Não me enjeites quando te escrevo
o que à memória me vem
contas contadas, contas da história
que a ninguém devo, a ninguém
Já não vejo razão para calar
as múrmures águas na areia
sobre a praia a maré cheia
enche toda antes de vazar
A noite dura para além da tarde
cerveja com levedura
vaga de espuma entre o meio dia
calma a garganta que arde
O tesouro no ventre do mar
não será para quem mareia
como é bom dormir, acordar
preguiçar em branca açoteia
O sentido que eu tive da vida
num café
o que foi certo para mim um dia
já não o é
O mar que passa
pela vidraça
senta-se à mesa
cheira a café
Cão vadio, cão sem raça
pela rua a vaguear
candeeiro
de luz baça
café moído
a exalar
À noite os
casais devassam
os enigmas
duma luz mansa
os sonhos
idos de criança
como
farrapos soltos que passam.
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