domingo, 19 de dezembro de 2010

o dia de Natal


Às vezes tenho saudades de coisas que nunca tive. O Dia de Natal, por exemplo.

Quando eu era mais pequeno o meu Natal era uma grande estafa, tudo porque a minha mãe e o meu pai estavam divorciados. Chegava o dia 25 de Dezembro e eu tinha de ir visitar a família da minha mãe e a família do meu pai. Cinco tios de um lado e mais três do outro. Uma barrigada de tios e tias, primos e primas que eu mal conhecia porque só encontrava no Dia de Natal. Diziam-me todos “Estás tão crescido!”, perguntavam-me coisas um bocadinho taralhoucas e davam-me imensas prendas idiotas porque não sabiam quais eram os meus brinquedos preferidos.

As prendas que eles me davam eram sempre as mesmas: uma quantidade enorme de carrinhos e comboios, comboios e carrinhos que eu não queria para nada porque gostava mas é de livros de histórias. E como ninguém me dava livros de histórias tinha que ser eu a inventá-las quando a noite chegava e me envolvia finalmente em paz.

Mas antes de chegar ao sossego da noite a infelicidade não parava de crescer. O pior era a comida. Tinha que almoçar, lanchar e jantar muitas vezes, quantas as tias que visitava.

A comida era sempre igual e vinha para cima das mesas a transbordar de grandes travessas, taças e terrinas. Canja, peru, salada de frutas, rabanadas, sonhos, trouxas de ovos, bolo rei, bolo rainha… Ao fim do almoço e do jantar ficavam todos muito vermelhos e a dar grandes gargalhadas e eu, que já não podia com tanta comida, mal acabava de almoçar na casa de uma tia da família da minha mãe tinha de ir a correr almoçar em casa duma tia da família do meu pai.

Pelo meio havia os lanches e o “Come mais qualquer coisinha que estás a crescer!”, frase que tinha de ouvir sempre que ia a sair muito agoniado de casa de uma das tias. Obrigavam-me sempre a voltar atrás para comer mais doces, bolos e chocolates e eu a protestar baixinho porque, além de estar muito cheio, gostava mas é de coroquetes.

Ao fim do dia a minha barriga parecia uma bola. Quase nem conseguia mexer-me. E tinha a cara toda lambuzada dos milhares de beijos que as tias me pespegavam nas bochechas, na testa e às vezes até no pescoço.

Por tudo isto é que tenho muitas saudades do Dia de Natal que nunca tive. Gostava que nesse Natal houvesse uma luz amiga e doce e muita gente à mesa, meninos, pais e mães, tios e primos, todos sorridentes e felizes. Ao canto havia de haver uma árvore de Natal cheia de bolinhas e não era preciso muita comida. Bastava haver música e uma canção que nos unisse a todos e alguém que contasse uma história feliz.

José Fanha

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