sábado, 16 de novembro de 2013


Era uma vez uma menina que pediu ao pai que fosse apanhar a lua para ela. O pai meteu-se num barco e remou para longe. Quando chegou à dobra do horizonte pôs-se em bicos de sonhos para alcançar as alturas. Segurou o astro com as duas mãos, com mil cuidados. O planeta era leve como uma baloa.
Quando ele puxou para arrancar aquele fruto do céu se escutou um rebentamundo. A lua se cintilhaçou em mil estrelinhações. O mar se encrispou, o barco se afundou, engolido num abismo. A praia se cobriu de prata, flocos de luar cobriram o areal. A menina se pôs a andar ao contrário em todas as direções, para lá e para além, recolhendo os pedaços lunares. Olhou o horizonte e chamou:
— Pai!
Então, se abriu uma fenda funda, a ferida de nascença da própria terra. Dos lábios dessa cicatriz se derramava sangue. A água sangrava? O sangue se aguava? E foi assim. Essa foi uma vez.”


Mia Couto, in Contos do Nascer da Terra




Mia Couto vence Prémio Internacional Neustadt de Literatura 2014

O escritor moçambicano Mia Couto, cuja obra em Portugal é publicada pela Caminho, foi anunciado, na noite de 1 de novembro, como vencedor do prestigiado Prémio Internacional Neustadt de Literatura 2014, no valor de 50 mil dólares, promovido, nos Estados Unidos da América, pela Universidade de Oklahoma, pela família Neustadt e pela revista World Literature Today.
A lista de nomeados para o prémio da Bienal Internacional de Literatura Neustadt integrava, além de Mia Couto, o escritor japonês Haruki Murakami, o argentino César Aira, a vietnamita Duong Thu Huong, o ucraniano Ilya Kaminsky, o norte-americano Edward P. Jones, o sul-coreano Chang-rae Lee, o palestiniano Ghassan Zaqtan e Edouard Maunick, das Ilhas Maurícias.
Um dos elementos do júri, Gabriella Ghermandi, responsável pela nomeação de Mia Couto, diz que se trata de «um autor que se dirige não apenas ao seu país mas a todo o mundo, todos os seres humanos». O diretor da revista World Literature Today refere que Mia Couto «tem tentado remover o espetro do colonialismo da cultura moçambicana, procurando revigorar a sua língua. Mestre na prosa em português, quer afastar esse fardo, palavra a palavra, frase a frase, narrativa a narrativa, e nesta enorme tarefa tem poucos ou mesmo nenhum escritor que se lhe assemelha».
O Prémio Neustadt é atribuído de dois em dois anos e representa o único prémio internacional no qual romancistas, argumentistas e poetas são considerados de igual modo. Muitas vezes chamado o “Nobel Americano”, por causa das suas ligações ao Prémio Nobel da Literatura, o Prémio Neustadt é considerado um dos mais importantes prémios literários do mundo. Ao longo do seu historial, entre os seus jurados, nomeados e vencedores, vários, como Pablo Neruda, Gabriel García Márquez, Orhan Pamuk, Mo Yan e Alice Munro, entre outros, foram vencedores do Nobel da Literatura.
Mia Couto é o 23º vencedor do Neustadt Prize e estará pessoalmente no Neustadt Festival, na Universidade de Oklahoma, no outono de 2014, para o receber.

Ao escritor, os nossos mais sinceros parabéns!

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